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Condo-hotel e a oferta de Contratos de Investimento Coletivos a partir da Instrução CVM n.º 602/2018

Em agosto de 2018, a Comissão de Valores Mobiliários - CVM editou a Instrução n.º 602 e estabeleceu nova regulamentação para as ofertas públicas de distribuição de contratos de investimento coletivo hoteleiro (CIC hoteleiro). Estes contratos se destinam a viabilizar o financiamento da construção de edifício hoteleiro mediante promessa ao investidor de rentabilidade baseada no resultado esperado da operação hoteleira.

A edição da norma foi precedida da Audiência Pública SDM 08/2016, na qual entidades associativas, investidores e advogados puderam contribuir para o aprimoramento da regulamentação do CIC hoteleiro.

Uma das principais contribuições na audiência pública foi para definir limites claros nos papeis desempenhados pelas incorporadoras e pelos operadores hoteleiros nas distribuições públicas de CIC hoteleiro em casos de stop orders decorrentes da oferta irregular desses valores mobiliários*, como se pode ver cristalizado no art. 2º, inciso II, da Instrução n.º 602:

Art. 2º Para os fins desta Instrução, considera-se:

I – “CIC hoteleiro” o conjunto de instrumentos contratuais ofertados publicamente, que contenha promessa de remuneração vinculada à participação em resultado de empreendimento hoteleiro organizado por meio de condomínio edilício;

II – “ofertante” a sociedade incorporadora ou qualquer outra pessoa que realize atos de distribuição pública de CIC hoteleiro; e

Ao responder as contribuições sobre a definição de ofertante, registrou de forma bastante clara que:

(..) ofertante é aquele que, de fato, realiza esforços de distribuição do CIC hoteleiro. De ordinário, é a sociedade incorporadora que desempenha esse papel, embora seja possível, a depender das circunstâncias do caso, que outra pessoa venha a ser ofertante (e.g., aquele que permuta o terreno por CIC hoteleiros que são, em seguida, distribuídos publicamente).

(...)

Com relação especificamente à operadora hoteleira, a CVM reconhece, inclusive em virtude da experiência acumulada nas suas rotinas de supervisão, que ela, usualmente, não é a responsável pelos esforços de venda dos CIC hoteleiros e, por consequência, não se enquadra no conceito de ofertante**.

No mês de janeiro de 2019, a CVM julgou o Processo Administrativo Sancionador CVM SEI nº 19957.011318/2017-00, instaurado pela Superintendência de Registros de Valores Mobiliários (SRE) para apurar eventuais irregularidades na realização de oferta pública de contratos de investimento coletivo relacionado aos empreendimentos hoteleiros com as marcas Ibis e Ibis Budget, em Parauapebas, no Pará*** . O operador hoteleiro foi absolvido, sendo destacado que os atos tipicamente praticados pelo operador hoteleiro não se confundem com atos de distribuição, aplicando retroativamente - à luz do princípio da retroatividade da lei mais favorável, consagrado no inciso XL do artigo 5º da Constituição Federal - a Instrução CVM 602, em especial o art, 2º, II, e as recentes decisões do Colegiado em casos similares.

A necessidade de prévio registro do CIC hoteleiro na CVM decorre do disposto no art. 2º, inciso IX, da Lei n.º 6.835/76 e art. 2º da Instrução CVM n.º 400/2003, segundo os quais são valores mobiliários sujeitos a prévio registro na CVM, quando ofertados publicamente, quaisquer outros títulos ou contratos de investimento coletivo que gerem direito de participação, de parceria ou de remuneração, inclusive resultante de prestação de serviços, cujos rendimentos advêm do esforço do empreendedor ou de terceiros.

Assim, ficou claro no julgamento que a penalidade pela oferta pública de contrato de investimento coletivo hoteleiro realizada de forma irregular, ou seja, sem o prévio registro – ou dispensa dele - na CVM, deve recair sobre a sociedade incorporadora ou qualquer outra pessoa que realize os atos de distribuição, até mesmo do operador hoteleiro se deles for partícipe.

Leonardo Gonoring é advogado e sócio do Abreu Júdice Advogados Associados

_____. *CVM. Processo Administrativo Sancionador SEI 19957.011318/2017-00

_____. **Audiência Pública SDM 08/2016. Disponível em http://www.cvm.gov.br/audiencias_publicas/ap_sdm/2016/sdm0816.html. Acesso em: 6 de fev. de 2019.

_____. ***CVM absolve operador hoteleiro por oferta irregular de condo-hotel. Disponível em http://www.cvm.gov.br/noticias/arquivos/2019/20190115-1.html. Acesso em: 6 de fev. de 2019.

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