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Atenção mineradores para prazos de títulos e suas renovações

Por Felipe Martins, advogado especialista em direito minerário

Como noticiado, foi publicada na data de hoje, 26/03/2020, a Resolução 28/2020 que suspendeu diversos prazos “processuais e materiais” dos Administrados em processos em trâmite perante a Agência Nacional de Mineração – ANM. A medida é bem-vinda e importante, pois traz um pouco de segurança jurídica aos mineradores, além de potencialmente evitar a judicialização nos processos administrativos.

Contudo, a mesma Resolução acaba trazendo insegurança quanto à abrangência de sua aplicabilidade, havendo dúvidas quanto a determinados prazos como o de apresentar relatório final de pesquisa (RFP) e requerimento de lavra, ou de pedido de renovação de títulos como guia de utilização ou licenciamento mineral, causadas principalmente pela previsão genérica trazida no inciso IV do art. 1º que fala em suspensão “das demais hipóteses de prazos” previstos no Código de Mineração, seu Regulamento e na Portaria 155/2016 do então Diretor-Geral do DNPM.

De fato, ao trazer disposição genérica, contrapondo-se à redação dos demais incisos do próprio art. 1º, muitos mineradores vem questionando a sua aplicabilidade a prazos importantes como os de apresentar o relatório final de pesquisa e o de requerer a lavra, cujo desatendimento causa a perda do título minerário, ou de renovação de guia de utilização, e implica na paralisação dos trabalhos de extração, trazendo danos patrimoniais importantes para o empreendedor.

Sem adentrarmos na análise da natureza jurídica desses dois principais prazos, o de apresentar o RFP e o de requerer a lavra, se decadenciais ou “singulares”, dentre outros, a resposta a essas dúvidas pode estar na própria redação da Resolução 28/2020, senão vejamos.

Conforme se verifica nos “considerandos” da Resolução, que trazem a sua motivação, verifica-se que a ANM justifica o ato em razão dos impactos no atendimento ao público resultantes de medidas insertas em alguns atos da própria Agência e de outros órgãos, ante a crise relacionada ao coronavírus e as medidas de isolamento social impostas ao país

Ainda, sustenta a necessidade de uniformizar procedimentos para regular “o funcionamento da Agência Nacional de Mineração”, além de mencionar expressamente a Portaria n.º 208/2020 que suspendera o atendimento presencial na ANM.

Como se percebe nessas razões, a Resolução foi sustentada essencialmente na suspensão de atendimento ao público, o que poderia prejudicar o Administrado no cumprimento dos prazos que expressamente descreveu, para os quais é essencial o acesso aos autos e que ainda em sua maioria não estão disponíveis eletronicamente. Assim, houve por bem a ANM listar nos incisos I, II e III do art. 1º as hipóteses de suspensão de prazo.

No que tange ao inciso IV do art. 1ª, entendemos que a sua falha de redação aplica-se a prazos de natureza semelhante aos dos incisos anteriores, tais como de atualização de cadastros, de opção por área em caso de interferência parcial, dentre outros não relacionados à vigência dos títulos, incluindo sua renovação, ou a trabalhos que independam de acesso aos autos, como abaixo tecemos breves considerações.

Com base nas premissas adotadas pela própria Resolução, entendemos que a suspensão dos prazos não é aplicável a prazos de títulos ou sua renovação, uma vez que a suspensão do atendimento pela ANM não prejudica, por exemplo, os trabalhos de campo necessários à elaboração de relatório final de pesquisa, e tampouco as análises necessárias para elaborar o plano de aproveitamento econômico que acompanha o requerimento de lavra.

De igual forma pensamos sobre prazos relacionados à vigência e eventual renovação de títulos minerários, tais como pedidos de renovação de guia de utilização, de licenciamento mineral, de permissão de lavra garimpeira, de mudança de regime, de contratos de arrendamento, ou outros como pedido de aditamento de novas substâncias, que tampouco entendemos que seus prazos sejam atingidos pela Resolução n.º 28/2020. Ora, em nenhum desses casos, a rigor, o prazo é impactado pela suspensão do atendimento pela ANM, não justificando a prorrogação do seu prazo.

É bem verdade que, a princípio, para a elaboração desses projetos e/ou pedidos podem ser necessárias informações constantes nos autos, mas cremos que deve ser analisado o caso concreto se essa falta impedirá a elaboração do projeto, ou ainda se em sua totalidade ou apenas parcialmente.

Nesse sentido, a própria legislação minerária já traz a ideia de justa causa para a prorrogação de prazos, tais como no art. 22, III, que trata de prorrogação de alvará de pesquisa, ou no art. 31, § único, ambos do Código de Mineração, que trata da prorrogação do prazo para requerer a lavra. Em ambas as hipóteses são exigidas justificativas para a impossibilidade de atendimento do prazo inicial, cabendo à ANM a análise do caso concreto. No caso de prorrogação do alvará de pesquisa, aliás, é exigida a apresentação de relatório parcial que descreva os trabalhos realizados até aquele momento; esses trabalhos são realizados fora da Agência, independentemente de acesso aos autos, e por isso a suspensão de atendimento na Agência não pode, a priori, obstar o atendimento pelo empreendedor, não justificando a geral suspensão desse prazo.

Outrossim, citamos os prazos para pagamento da Taxa Anual por Hectares ou da CFEM, ou para apresentação da declaração de investimentos em pesquisa mineração, que tampouco entendemos que estejam abrangidos pela suspensão da Resolução 28/2020, por também serem obrigações e atos decorrentes de títulos ou de trabalhos realizados independentemente de acesso aos autos ou atendimento pela ANM.

Pelo exposto, é nosso entendimento que a Resolução nº 28/2020 não abrange prazos relacionados à vigência ou outorga dos títulos minerários, acima exemplificados, merecendo máxima cautela dos empreendedores.

Entendemos que seja salutar o esclarecimento pela ANM da aplicabilidade ou não da Resolução a todos os prazos, com as exceções expressamente previstas em seu texto.

Por fim, cremos que a maior transparência no processo de criação da Resolução, com a liberação de acesso aos pareceres e notas que sustentaram a elaboração do ato administrativo, especialmente aqueles proferidos no processo SEI 48051.001385/2020-13, poderia trazer mais luz sobre a intenção e abrangência do instrumento, e assim trazendo a intencionada segurança jurídica para os mineradores nesse momento de grandes incertezas.

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